I
A ti, ó Senhor !
Na solidão deste templo
Onde o insenso
M’embriaga
A ti me dirijo
A ti proclamo
Em ti ó Senhor !
Pequeno como um seixo
Nas mãos dum ribeiro
Como um luar por
Entre canaviais
Em ti sossego
Em ti sossego
A minha fronte
Cansada de tanto
Cogitar
Em ti sossego
Os meus membros
estigmatizados
Vem, ó Senhor
Abre o teu manto
Toma-me em teu regaço
e deixa-me planar
para além das minhas
fronteiras
para além
de todas as palavras...
vem, ó Senhor
Vem, com passos de borboleta
e perfumes de rosas
por entre um mar de candeias
Ás horas mortas
e deixa-me ver para
além dos olhos
tal como tirésias...
Vem, Senhor
vem
Recebe a minha oração
Deixa-me por um pouco
Mergulhar no teu ventre
De nada
Saborear o ar da praia
Onde não existem
Horas absurdas
Onde o Alpha e o Omega
Dançam ao ritmo
Da madrugada
Vem, ó Senhor
Penetra a minha angústia
Penetra a minha solidão
II
Para conseguir avançar
Mas para conseguir
Mesmo avançar
Procuro os teus olhos
Olhos povoados de mares
E selvas intocáveis
Onde a clorofila é translúcida
E as borboletas são livres
E as caravelas do Gama
Perfuram o verde das palmeiras
Com cânticos de louvor
E os ossos de animais antigos
Se misturam com o plâncton
Rodeado de peixes, mastros
E ânforas fosforecentes
E iluminam a noite
Do nada
Mistura irredutível
Entre lâminas e mandíbulas
De mistérios
Sim
para conseguir avançar
procuro os teu olhos,
amplos, d’águas ternas
avistados por Tirésias
algures
entre baías e pórticos
de paz e descanso
ou por trás do arvoredo
ou por trás dos nossos corpos
agitados pelos vendavais
da vida moderna...
Ah! sim, esses teu olhos...
Que os ribeiros tornam rios
E os rios tornam mares
E que absorvem os astros
E que tragam os deuses
De barro
E que digerem os desertos
Com seus rochedos,
Noites e dias
E que são carne
Da nossa carne
Sangue do nosso sangue...
Esses teus olhos...
- Luís Costa, II Salmos
quarta-feira, 24 de dezembro de 2008
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